Esta foi uma das frases de ordem mais proferidas durante a Marcha pela Vida Independente que juntou, na Cidade Berço, a dia 05 de maio, o Dia Europeu da Vida Independente, cerca de sete dezenas de pessoas numa demonstração vibrante de determinação e união.
A defesa da vida independente e a reivindicação por uma assistência pessoal adequada e acessível a toda a gente que dela precisa começou tímida, mas logo ganhou força e conseguiu chamar a atenção dos transeuntes que passeavam no centro de Guimarães.
“Acho que o objetivo final foi conseguido: as pessoas têm que nos ver mais na rua, têm de ter noção que a exclusão existe quando só se olha para o umbigo”, começa por dizer a coordenadora da Marcha em Guimarães, Cristiana Marques.
Os manifestantes seguravam cartazes coloridos com mensagens poderosas, exigindo acessibilidade, igualdade de oportunidades de emprego e respeito pela dignidade e autonomia das pessoas com deficiência. De megafone em punho, gritava-se com toda a força: “Nem menos, nem mais: direitos iguais”. Este foi outro dos slogans de protesto partilhado por tantos outros grupos oprimidos em tantas outras manifestações realizadas ao longo do ano.
A Vida Independente em Marcha (VIM), que chama a atenção para as questões enfrentadas, diariamente, pela comunidade de pessoas com deficiência e que exige mudanças significativas nas políticas sociais, também se multiplicou por Vila Real, Porto, Coimbra, Lisboa, Faro e em São Miguel, nos Açores.
Ao todo, foram à volta de 500 as pessoas que saíram à rua por todo o país para defender os diretos das pessoas com deficiência. “As marchas e concentrações de Vila Real, Guimarães, Porto, Coimbra, Lisboa, Faro e Açores fizeram história, levando o maior número de pessoas à rua para celebrar o dia 5 de maio, de sempre”. Marchámos com chuva, sol e, claro, com as nossas mães também”, refere o VIM nas redes sociais.
A delegação do Vale do Ave do Centro de Vida Independente (CVI), que completou recentemente um ano de existência, foi um dos elementos ativos do coletivo que contou com a participação de movimentos sociais, como o SOS Racismo, ILGA Portugal, Rede 8M, Plataforma Feminista, Rede Ex Aequo, entre outros, numa demonstração propositada de que a luta é intersecional.
“Resumir numa só palavra seria muito pouco para descrever o esforço envolvido na organização da marcha bem como a gratidão final pelo objetivo conseguido”, refere Cristiana Marques. “Sendo a nossa primeira marcha enquanto delegação do Vale do Ave fiquei feliz com a mobilização das pessoas sem deficiência e dos restantes movimentos sociais no apoio às exigências das pessoas com deficiência, provando que, mesmo por cumprir, os direitos são iguais e a luta de uma pessoa é a luta de todas as pessoas”, acrescentou, considerando que esta foi mais uma experiência que serviu para mostrar a toda a gente que “a união faz a força”. “Quando se quer muito que algo aconteça e trabalhamos para isso o resultado é a nossa melhor recompensa”, avalia.
Mas nem só de gritos de protesto se fez esta manifestação que defende “uma efetiva autorrepresentação e autodeterminação” das pessoas com deficiência, havia também expressões de solidariedade e de esperança, destacando a importância de uma sociedade verdadeiramente inclusiva, como a moldura humana presente conseguia, em muitos aspetos, representar.
As vozes das pessoas com deficiência, familiares, amigos e outros ativistas de direitos humanos foram ouvidas pelas ruas da cidade – rua Santo António, rua Gil Vicente e rua Paio Galvão – percorreram o Largo do Toural e só se calaram junto ao coreto localizado no Jardim da Alameda decorado por vários cartazes alusivos à luta pelos direitos das pessoas com deficiência.
Foi o momento de se concretizar a leitura do manifesto preparado pelo movimento Vida Independente em Marcha e de se proferirem discursos emocionantes sobre as barreiras sociais, culturais e políticas que continuam a excluir as pessoas com deficiência.
Foi enfatizada a necessidade de uma mudança estrutural e sistémica para garantir a inclusão e a participação plena das pessoas com deficiência na sociedade e foi um momento importante para os manifestantes reafirmarem o respetivo compromisso com a luta contínua pela inclusão e pela justiça.
Embora os desafios possam ser muitos, a determinação em superá-los e construir um mundo mais inclusivo e compassivo permanece inabalável. Esta primeira marcha da delegação do Vale do Ave do CVI não é apenas um evento isolado, mas sim um passo crucial na jornada rumo a uma sociedade verdadeiramente acolhedora para todos.
“Há muita coisa a mudar? Há. Mas mais do que mudar sítios, precisamos de mudar mentalidades. Não sei se levará muito ou pouco tempo mas, ficarei feliz se deixar o mundo um pouco melhor que o encontrei”, conclui Cristiana Marques.
O futuro da assistência pessoal
A publicação da Portaria n.º 415/2023, de 7 de dezembro, determina que as entidades que visam implementar um CAVI podem celebrar acordos de cooperação visando o desenvolvimento e execução da resposta social Serviço de Apoio à Vida Independente (SAVI), competindo ao INR, I. P., em articulação com o ISS, I. P., e à equipa multidisciplinar nacional, acompanhar a atividade dos CAVI.
Os 36 Centros de Apoio à Vida Independente (CAVI) que existem atualmente tiveram um aumento de 30% de financiamento, pós o final do projeto-piloto, para as pessoas que precisam de apoio para se levantar da cama, para se orientarem na cidade ou para fazerem as suas refeições e alimentar-se.
As milhares de pessoas que estão em lista de espera continuam a aguardar por resposta, apenas possível com a abertura de novos CAVI, cujo despacho a antiga Secretária de Estado da inclusão, Ana Sofia Antunes, concretizou em fevereiro de 2024, autorizando a celebração de Acordos de Cooperação para a resposta social Serviço de Apoio à Vida Independente.
Do balanço efetuado no final da legislatura, Ana Sofia Antunes dá conta que os novos acordos de cooperação com os Centros de Apoio à Vida Independente que tornaram a assistência pessoal para pessoas com deficiência uma resposta permanente da Segurança Social para pessoas com deficiência preveem o alargamento do número de horas de assistência pessoal em cerca de 10 mil horas em relação aos projetos-piloto anteriormente em vigor: existirá um aumento de 94 mil horas mensais para as 104 mil horas agora contratualizadas.
Dos atuais 1.060 destinatários estima-se alcançar cerca de 1.250 destinatários e o consequente aumento de assistentes pessoais que agora totalizam os 788.
Ainda assim, o coletivo Vida Independente em Marcha receia o futuro desta resposta, ao constatar que o “Governo recentemente empossado não integrou uma linha que fosse sobre a Vida Independente no programa de Governo”.
Elaboração dos cartazes
Foi no dia 01 de maio que, em Guimarães, as pessoas se juntarem, na Praça do Instituto de Design para a criação de cartazes alusivos a utilizar na Marcha pela Vida Independente.
Este momento criativo, transformou tintas e marcadores coloridos em frases fortes que, à medida que se marcavam no papel, se interiorizavam na mente.
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