Falar das comemorações do Dia Internacional das Pessoas com Deficiência em Guimarães é falar de 10 eventos realizados ao longo de duas semanas. É falar de ações de formação e de sensibilização, da apresentação de um livro e de uma caminhada. É falar de um Pregão recitado, de uma largada de pombos, de uma demonstração de Judo e da entrada dos jogadores do Vitória no jogo com o Rio Ave. É falar do grande espetáculo no Centro Cultural Vila Flor (CCVF), o culminar de toda esta celebração e o ponto de encontro por excelência desta festa da inclusão.
E é por aí que começamos. A 05 de dezembro realizou-se o espetáculo “Diferentes Vozes: Por uma Sociedade Capacitada e Inclusiva para todos!”. O grande auditório do CCVF estava cheio e o borburinho que se ouvia apontava para a presença massiva de crianças. Nada melhor para o que se estava prestes a assistir.
O Agrupamento de Escolas João de Meira estreou o palco com um número que dava primazia aos gestos. O silêncio foi apenas interrompido pelas palmas no final. Problemas técnicos fizeram adiar a apresentação da Associação de Paralisia Cerebral de Guimarães (APCG) e foi nesse momento que toda a capacidade de improvisação do apresentador foi posta à prova. Carlos Xavier, como já vem sendo habitual, desdobrou-se em esforços para animar a plateia nos intervalos dos números. E é uma tarefa que tem cumprido com sucesso, a ver pelas gargalhadas que consegue arrancar à criançada.
“Josefina vem cá abaixo, isto não pode ser assim. Eu não posso mais viver sem você perto de mim”, foi a cantilena que acompanhou os intervalos de todo o espetáculo. Em si mesma, já parecia um número e os miúdos esperavam por ele, ou melhor, por ela, a Josefina que insistia em não descer.
A Associação para a Integração e Reabilitação Social de Crianças e Jovens Deficientes de Vizela encantou ao som da música Fix You dos Coldplay. Seguiram-se os confetis, as palmas e depois de se chamar mais uma vez a Josefina, cantou-se os parabéns à Carolina, uma menina que depois de atuar teve direito a esse mimo da plateia. Esperava-se pela atuação do Agrupamento de Escolas Fernando Távora que aproveitando a ocasião replicou todos os números das festas Nicolinas. Depois convidou o Fernando e o António, ambos clientes da Cercigui, a jogar o jogo da Glória. Escusado será dizer que a competição ficou empatada e o prémio teve que ser repartido.
A APCG finalmente estava a postos para a apresentação. Tic Tac, Tic Tac ouviu-se primeiro e depois de uma música instrumental, o número de dança seguiu ao som de “A Thousand Years”, uma música de Christina Perri que convidou a plateia a acompanhar a melodia com várias lanternas de telemóveis.
O Lar Residencial e Centro de Atividades Ocupacionais Alecrim da Santa Casa da Misericórdia com um medley de músicas bastante divertidas foi apresentando, uma a uma, as cores do arco-íris. “Não sei onde nasce o arco-íris mas sei onde estão todas as cores que alegram e dão sentido à minha vida”, serviu de mote a várias canções, entre elas a “Amar pelos dois” de Salvador Sobral, a “Grândola Vila Morena” de Zeca Afonso, “Angel” de Robbie Williams e a “Thriller” do lendário Michael Jackson. Do Agrupamento de Escolas da Abação contou-se a história da Thiana, uma menina da ilha de Santiago, em Cabo Verde, e de toda a aventura intercultural que experienciou, numa espécie de ode à amizade fechou a atuação com o refrão “Cor, magia, alegria, tuuuu, tuuuuuuu”.
Do Agrupamento João de Meira relembrou-se uma música da Ana Malhoa enquanto apresentadora do programa televisivo Buéréré e houve lugar para um número de dança ao som da fadista Mariza.
A Cercigui apresentou uma peça que veio agitar a plateia e divertir todos os presentes. “Animação no convento” conseguiu, ao jeito do cinema mudo, contar uma engraçada história de quatro freiras que gostavam muito de dançar. O espetáculo fechou com o Agrupamento de Escolas das Taipas que se propôs a contar a história da Carochinha mas numa versão, por assim dizer, mais moderna.
A Josefina não desceu, mas o senhor Xavier decidiu não esperar por ela e deu por encerrado o espetáculo. Para o ano há mais.
Formação “Comunicação (In) Acessível ou Não? Eis a Questão”
Foram 17 os participantes na ação de formação e sensibilização “Comunicação (in)Acessível ou não? Eis a questão” ministrada pela Plural&Singular. Esta ação de formação e sensibilização sobre comunicação acessível e inclusiva promovida pelo Fórum Municipal das Pessoas com Deficiência e pela autarquia de Guimarães teve como intuito proporcionar aos principais intervenientes nesta área uma oportunidade para comunicarem cada vez melhor e chegarem a mais pessoas. Mas a desconstrução de mitos e preconceitos e consequente discriminação é no fundo o grande objetivo desta iniciativa que vai ao encontro da atividade que o Fórum Municipal das Pessoas com Deficiência tem promovido ao longo dos respetivos 15 anos de existência.
Conversas na escola
Os dias 28, 29 e 30 de novembro estavam reservados às “Conversas na escola”, uma iniciativa que todos os anos tem levado o testemunho de algumas pessoas com deficiência junto da comunidade escolar para que as crianças e jovens se aproximem mais desta realidade, percebam as dificuldades associadas e desta forma tenham vontade de participar de forma ativa na construção de um mundo mais inclusivo. As escolas EB 2,3 João de Meira, da Abação e Fernando Távora receberam Lúcia Silva e Rosa Guimarães que, em cada um dos estabelecimentos de ensino, se fizeram acompanhar pelo atleta Manuel Mendes, por um representante do Centro de Formação e Reabilitação Profissional da Cercigui e pelo escritor João Artur Fernandes. Por exemplo, cerca de 75 alunos, três turmas do 6.º ano, da Escola EB 2,3 da Abação tiveram a oportunidade de conhecer melhor a problemática da cegueira, “porque Lúcia Silva deu o testemunho de como foi a sua vida com o marido que era cego e João Artur Fernandes falou de como foi a sua vida desde que perdeu a visão”. “Os alunos fizeram perguntas muito pertinentes, ficaram muito sensibilizados e no fim até alguns estavam a chorar de ver a força da natureza daquelas pessoas a transmitir aquele entusiasmo mesmo tendo aquele problema”, lembra a coordenadora da Educação Especial, a professora Maria Jesus Faria.
Apresentação do livro “ Avanços e Recuos e…” de João Artur Fernandes
No dia Internacional das Pessoas com Deficiência, 03 de dezembro, foi apresentado no auditório da Biblioteca Municipal Raul Brandão o livro “ Avanços e Recuos e…” de autoria de João Artur Fernandes.
É através da poesia que este vimaranense dá largas à sua escrita criativa e esta obra de linguagem corrente e acessível surge em continuidade da anterior publicação “Lágrimas, revolta, amor e fantasias”.
Caminhada Inclusiva, leitura do Pregão e largada de Pombos
Os atletas Dulce Félix, Ricardo Ribas, Manuel Mendes e Neno deram um exemplo positivo ao participaram na Caminhada Inclusiva que percorreu o centro histórico de Guimarães para chamar a atenção de TODOS para o facto dos direitos das pessoas com deficiência serem direitos humanos que ainda estão muito longe de serem cumpridos.
Este é o evento do programa de comemorações do Dia Internacional das Pessoas com Deficiência que mais visibilidade dá a esta causa. Esta caminhada inclusiva não passa, definitivamente, despercebida. Mesmo os mais distraídos acabam por perceber o porquê de tanta gente caminhar junta na rua a envergar a mesma camisola quando recebem o prospeto do Pregão, habitualmente, lido no final da marcha junto à Câmara Municipal de Guimarães.
A partida deu-se no Paço dos Duques de Bragança e depois da passagem pelo Largo do Carmo, de descer a Muralha e percorrer a Alameda São Dâmaso, se chegou ao Largo do Toural. O percurso ia a meio e a multidão, ao som de caixas e bombos e com palavras de ordem erguidas em punho – “Direito ao trabalho”, Direito à felicidade”, “Direito à igualdade” – seguiu pela rua Santo António em direção ao Largo dos Laranjais.
À chegada ao Largo Cónego José Maria Gomes foi dada a palavra à vereadora da Ação Social, Paula Oliveira e ao presidente da câmara, Domingos Bragança que valorizou o esforço coletivo em prol da inclusão e destacou um dos cartazes – “Também queremos namorar” – para referir que o direito à dignidade também passa pelos afetos.
Para o Pregão fez-se silêncio e António Cardoso, um dos elementos do Fórum Municipal das Pessoas com Deficiência em representação da Tempo Livre, fez uso dele. O texto satírico em verso que salienta a falta de cumprimento dos direitos das pessoas com deficiência, inspirado nas Festas Nicolinas que decorriam em simultâneo, foi aplaudido por todos os presentes e pode ser lido AQUI.
Manuel Mendes, o atleta vimaranense que arrecadou uma medalha de bronze nos Jogos Paralímpicos Rio 2016, não saiu desta caminhada cansado, mas saiu satisfeito por sentir que a respetiva participação poderá servir de motivação a estas crianças e jovens. “Servir de inspiração e mostrar que se nós formos humildes e lutadores podemos conseguir levar uma vida normal, mesmo numa sociedade que aqui ou ali é um bocado cruel. Mas quando queremos são poucas as barreiras que nos fazem parar”, referiu o atleta depois da leitura do Pregão. Manuel Mendes considera que esta caminhada serve também de alerta para a sociedade em geral “porque estes miúdos sabem que são capazes, a sociedade, às vezes, é que acha que não são capazes”.
Entrada no relvado dos atletas do Vitória acompanhados por jovens com diversidade funcional
O nervoso miudinho misturado com o entusiasmo foi inevitável. Afinal estavam mais de 22 mil adeptos no Estádio D. Afonso Henriques para assistir ao jogo da 12.ª jornada da Liga portuguesa de futebol que colocava frente a frente o Vitória Sport Clube com o Rio Ave. Foram vários os clientes com deficiência das instituições e escolas de Guimarães que aceitaram enfrentar os holofotes e entrar em campo com os jogadores do Vitória para, mais uma vez, sensibilizar a opinião pública para os direitos das pessoas com deficiência. Com o triunfo por 3-2 o Vitória consolidou o quinto lugar e o regresso a casa da maioria dos que assistiram ao jogo foi feliz e mais consciente da necessidade de se batalhar por uma sociedade mais inclusiva.
Aula Aberta de Judo
Para fechar o programa de Comemorações do Dia Internacional das Pessoas com Deficiência realizou-se uma demonstração de Judo nas instalações da Cercigui para que os interessados pudessem experimentar esta modalidade e ao mesmo tempo para promover e sensibilizar o direito à prática do desporto para as pessoas com deficiência.
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